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Espiritualidade Slow

SINTONIAS ENTRE O MOVIMENTO SLOW E A VIA PARA A ESPIRITUALIDADE

Por Raquel Tavares*





O mundo atual é cheio de estímulos e ruído. Silenciar é abrandar e é criar tempo.

Vivemos numa correria e excesso de ‘coisas’ e troféus, mas vivemos em pobreza e escassez de tempo. Vivemos uma tendência generalizada para a superficialidade e pressa, sem aprofundamento e foco nas nossas experiências.


Valoriza-se em demasia uma vida repleta de atividades, de adrenalina e rapidez, desprezando-se as vivências e momentos simples e calmos que a vida nos oferece.

O Movimento Slow vem trazer um contrapeso a esta tendência cultural generalizada da pressa, aceleração, stress, falta de tempo e superficialidade. Reforça os valores contrários, de um maior sossego, profundidade, boa lentidão, equilíbrio, moderação, simplicidade, calma. Convida-nos a olhar para dentro. Valorizar o Eu, o aqui e o Agora. O Ser em vez do fazer. O viver em vez do ter.


Como é que o Movimento Slow se relaciona com a Espiritualidade?


Porque é que o Movimento Slow se relaciona com a necessidade de silêncio com significado? Porque é tão necessário falar nesta quietude e neste silêncio?



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“Rápido é superficial. Lento é profundo”.

Carl Honoré

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1. Espiritualidade


A espiritualidade pode ser definida como uma propensão humana para buscar significado para a vida, que pode ou não estar ligada a uma vivência religiosa.

Segundo diversas confissões religiosas, a espiritualidade traduz o modo de viver característico de um crente que busca alcançar a plenitude da sua relação com o transcendente. Contudo, alguns autores, porém, defendem a existência de uma espiritualidade inclusive em meio ao ateísmo.

A espiritualidade tem sido bastante estudada no que se refere às suas relações com a saúde humana. A Organização Mundial de Saúde (OMS) tem vindo a aprofundar as investigações sobre a espiritualidade enquanto elemento integrante do conceito multidimensional de saúde. Atualmente, o bem-estar espiritual tem vindo a ser considerado mais uma dimensão do estado de saúde, a par das dimensões corporais, psíquicas e sociais.



2. Desacelerar é o primeiro passo para a espiritualidade


Desacelerar é essencial para o desenvolvimento da espiritualidade.

Todos os que se interessam pela espiritualidade enfrentam um desafio que passa por não ficar pela superficialidade, mas sim por superar os "ruídos" que impedem a ligação aos aspetos verdadeiramente essenciais da vida.

Quando abrandamos permitimos o encontro connosco próprios. E, ao cultivarmos essa interioridade, lançamos bases sólidas para o desenvolvimento espiritual.

Esta educação para a interioridade é algo que está muito negligenciado nas sociedades modernas.

O Movimento Slow orienta-nos no sentido do uso sábio do nosso tempo, o qual pode facilmente pode ser desperdiçado, uma vez que a vida está repleta de estímulos externos que nos distraem do que é mais importante e essencial.


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“O silêncio e a calma como a via para o aprofundamento da alma. “

Raquel Tavares

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3. Tempo e espiritualidade


Desde sempre que as grandes religiões e correntes espirituais alertam para o uso do nosso tempo e para o foco no que realmente dá sentido à vida.

A valorização da simplicidade e das pequenas vivências ou momentos, remonta às antigas tradições religiosas, espirituais ou filosóficas, relacionando-se aos ensinamentos de líderes religiosos como Zaratrusta, Buda, Lao Tse, Confúcio, bem como às tradições culturais Greco-Romana e Judaico-Cristã. Diferentes figuras importantes da história religiosa ou não, valorizaram um estilo de vida simples, tais como São Francisco de Assis, Rabindranath Tagore ou Mahatma Ghandi, todos eles com um forte desenvolvimento espiritual.

A filosofia Slow preconiza uma atitude de maravilhamento com as coisas pequenas e simples, a atenção aqueles pormenores que só reparamos quando abrandamos.

Permite o encantamento com a flor que nasceu ou com um pintainho que corre, com a forma das nuvens e os padrões de um tapete, assim como com as lágrimas de alguém, a alegria de um jogo em família ou o som da chuva a bater na vidraça. Os movimentos da respiração e do bater do coração. Permite a contemplação do aqui e agora.



4. Da Globalização à unidade na diversidade


Sendo o Movimento Slow um movimento à escala global é composto por diferentes tipos de pessoas, como tal, é capaz de abarcar as diferenças, sejam elas culturais, etárias ou de estilo de vida, para as unir em torno de objetivos comuns.

Dessa sintonia somos conduzidos de forma natural para outros pontos de encontro de objetivos atuais no âmbito da religião: a unidade na diversidade.


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“Qualquer movimento que crie paz e concórdia na sociedade humana é verdadeiramente um movimento divino; qualquer reforma que faça as pessoas se reunirem sob o abrigo do mesmo tabernáculo é certamente animado por motivos celestiais.”

( A Promulgação da Paz Universal )

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No âmbito da procura Religiosa pela Paz Mundial e uma nova ordem social, o Movimento Slow é um movimento pacífico e pacifista.

A religião para além dos aspetos místicos e espirituais pretende ter sempre uma forte componente de princípios sociais e éticos, a luta pelo combate às desigualdades sociais, a proteção dos mais fracos marca muitas vezes as agendas religiosas.


Também o movimento Slow, como a maioria dos movimentos sociais, alerta, sensibiliza e promove a luta contra as desigualdades, nomeadamente no que se refere à pobreza de tempo que é transversal e afeta de inúmeras e diferentes maneiras as diferentes pessoas em variados pontos do globo.


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É necessário tempo e desaceleração para:

- O desenvolvimento integral da pessoa humana nas suas diferentes vertentes, nomeadamente a espiritual;

- Acreditar que há mais do que apenas aquilo que os nossos sentidos percecionam;

- Compreender o sentido da vida;

- Procurar e encontrar no dia a dia quotidiano, um espaço e um tempo adequados, de calma, introspeção e de silêncio, com pausas inspiradoras, em compensação ao bulício e à trepidação frenética na qual muitos de nós vivem todos os dias.

- O verdadeiro encontro consigo próprio, com o outro e com o transcendente.


O Movimento Slow é uma pulsação complementar à vida agitada dos nossos dias, que

permite um tempo de reflexão contemplativa, um silêncio com sentido que ajuda a que as vivências ecoem interiormente e que possam conduzir à espiritualidade e à sabedoria.


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o*Raquel Tavares nasceu em 1969. É licenciada em Antropologia Social e tem uma pós-graduação em Psicologia Educacional. Trabalhou na área da intervenção comunitária e na educação de adultos. O associativismo, a solidariedade e o voluntariado fazem parte do meu quotidiano. Ao longo da sua vida desenvolveu uma necessidade imperiosa de movimento feito de tranquilidade. Sempre precisou de calma para refletir e digerir as informações e os estímulos externos e assim, nasceu o seu interesse pelos modos de vida mais brandos, que surgem como contra corrente ao mundo acelerado. Em 2009, surgiu-lhe a ideia de formar uma associação com base nos princípios de uma tendência internacional, mas ainda muito pouco falada na altura. Com um grupo de amigos, deu corpo a essa ideia e é assim que surge o Movimento Slow Portugal, cujos princípios servem de base ao seu primeiro livro.

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